Quinto dia
O anjo do SENHOR acampa-se ao redor dos que o temem, e os livra.
Salmo 34, verso 7
Salmo 34, verso 7
A noite passou bem. Dava para ouvir o barulho dos carros que passavam na estrada, mas eu só percebi isso pela manhã. Dormi profundamente, muito cedo, e acordei revigorado. Cecília também tinha dormido o bastante.
Depois de comer, enrolei os colchonetes isolantes e os sacos-de-dormir enquanto Cecília equipava as bicicletas. A cada noite, nós retirávamos todos as partes elétricas, que não suportariam a umidade da noite. As garrafas d'água vinham também, logicamente, por outra razão: nós precisávamos da água. Então, enquanto eu arrumava uma parte da bagagem, Cecília cuidava disso. Cadeado, lâmpadas traseiras, dianteiras, velocímetro, garrafinhas.
Depois, eu comecei a refletir sobre como carregar os sacos de dormir. Nada do que tínhamos pensado até então tinha funcionado perfeitamente. Primeiro, Cecília carregava o dela, eu o meu. Só que o peso nas costas dela doíam em mim, embora ela não reclamasse. Já no segundo dia, eu amarrei os dois colchonetes na mochila dela (350 g) e os dois sacos-de-dormir na minha (2,5 k). Me parecia justo. A barraca foi amarrada na N1, no quadro durante o primeiro dia, e atrás da cela do segundo ao quarto dia. Essa configuração deixava minha bagagem extremamente desconfortável. O peso é suportável, mas os sacos-de-dormir pendurados eram muito desajeitados a cada vez que eu tinha que retirar a mochila, e também enquanto pedalávamos. Na manhã do quinto dia, eu estava resoluto a começar o dia com uma solução melhor. Decidi tentar amarrar os dois sacos-de-dormir atrás da cela da N1 e a barraca na mochila. Assim, o maior peso estaria sobre a bicicleta, e haveria um elemento a menos pendurado às minhas costas. Foi nesse dia que nasceu a melhor configuração, se bem que ela não era ainda perfeita, como iríamos verificar.
Quando tudo estava empacotado e pendurado na gente, fomos saindo da floresta, empurrando as bicicletas também carregadas.
Uma vez na estrada, pedalamos muito e conversamos bastante também. Decidimos ficar atentos à hora do almoço, e avançar o máximo possível. Nesse dia, as paisagens se revelaram as mais lindas. As colinas de pasto tinham um verde especial, vimos uma igreja antiga e majestosa, que se passaria por castelo. Nos deparamos com uma manada de bois e vacas, guiada por um homem a pé, seguida por outro à trator. Quando eu estava passando, vi um carro que vinha no sentido oposto que certamente atrapalharia Cecília, que estava mais atrás. Passei a manada e parei mais à frente. Voltando-me para trás, vi que, de fato, ela precisava esperar uns momentos. Foi aí que eu percebi um velhinho passando ao meu lado, a meio quilômetro por hora.
- Bom dia! - Exclamei.
Ele abriu um sorriso e respondeu um bom dia não muito nítido, no momento em que Cecília passava. Segui atrás dela por algum tempo.
Enquanto pedalava, eu olhava para o eixo do pedal, escrutando quanto mais ele iria girar. Antes que o defeito se manifestasse novamente, paramos em um vilarejo tão calmo, que nos dissemos que era uma cidade fantasma. Não vimos ninguém, nem gente nem bicho. Nem uma janela aberta. Nada.
A vila era realmente pequena, com duas ou três ruas que se cruzam, e dois caminhos que dão na estrada departamental, um inclinado para cada direção, formando um pedaço de pasto triangular. Percorremos um pouco da vila, procurando algum sinal de presença, e vimos dois carros estacionados em frente a uma casa. Nos aproximamos e tocamos o sininho que pendia ao lado da porta. Quando uma senhora apareceu, pedimos água e, talvez uma ferramenta, para tentar consertar a bicicleta.
- Ah, eu vou chamar meu filho. Ele pratica bicicleta.
Momentos depois, um homem formado, alto e loiro, apareceu, perguntou qual era o problema, olhou o pedal, mexeu, e começou a balbuciar um diagnóstico técnico, entre soluções possíveis, enquanto mergulhou de volta no interior da casa, de modo que ouvimos sua voz se afastar, sem se calar. Não deu para entender muita coisa. Mas me parecia que ele sabia o que estava dizendo, e algo muito lógico me dizia que ele voltaria com uma caixa de ferramentas.
Minutos depois, eu me vi diante da N1 sem algumas peças do pedal, sendo martelada violentamente de um lado, enquanto eu apoiava um pedaço de madeira do outro. Enquanto martelava, o homem declarou que já correu muito de bicicleta, que já fez corridas importantes, de enduro, e que agora fazia outros esportes. Perguntou até onde iríamos, se o frio não atrapalhava muito, e não parava de trabalhar. Os golpes de marreta que N1 estava suportando me pareciam muito duros, mas o homem não tinha pedido licença, tinha tomado toda a liberdade de martelar o que quisesse, e parecia tão certo do que fazia, e afirmava experiência tão vasta no assunto, que eu não ousaria interrompê-lo. Além disso, o que mais eu poderia fazer?
Pouco tempo depois, nós agradecemos, ele nos desejou boa estrada, sua mãe ofereceu comida, nós recusamos polidamente, e seguimos viagem, com o pedal bastante diferente. O rolamento está podre, mas até o momento em que eu escrevo é o mesmo, e não travou mais.
Carregamos conosco também a preciosa informação de que encontraríamos uma loja especializada em bicicleta na cidade de Tournus, a 50 km dali. E decidimos que naquele dia chegaríamos naquela cidade. Pedalamos o dia inteiro, com a responsabilidade de termos que avançar o bastante para consertamos a bicicleta, que ainda não sabíamos se estava curada, e encontrarmos um cyber-café para mandarmos notícias para o Brasil e para a Suíça.
Foi com esforço que alcançamos nosso objetivo, mas já era um pouco tarde, o sol se pôs um pouco antes de chegarmos ao centro da cidade e encontrarmos aberta a tal loja. Queríamos comprar também um bagageiro para Rippley e dois pares de óculos escuros (tínhamos perdido os nossos no primeiro dia da viagem). Um homem simpático nos atendeu, conversamos um pouco, ele analisou rapidamente N1. Ele nos deu o diagnóstico, que coincidia com o do esportista da cidade fantasma, e acrescentou que a ferramenta necessária tinha quebrado no dia anterior.
- Quebrou ontem?! E não tem outra ferramenta ou outra maneira de consertar?
- Não... Sinto muito.
Saímos da loja um tanto desanimados, mas era preciso seguir. Estava ficando tarde, precisávamos encontrar logo um lugar para montar a barraca. Saímos da cidade, pegamos novamente a estrada, mas estava escuro. Eu estava com medo. Encontramos um vilarejo com algumas casas grandes e bonitas. Nada de fazendas ou grandes pastos, uma área nobre – “vai ser difícil...”.
Era véspera de Natal. As janelas emanavam a felicidade egoísta do mundo moderno. Pouca gente ousaria abrir a porta. Poucas portas tinham campainha. A última casa da rua tinha um jardim enorme e umas árvores ao longe, atrás. Uma porta de vidro revelava uma cozinha aconchegante no interior, onde uma mulher remexia os preparativos de uma refeição. Já estava escuro. Cecília tirou a mochila, o gorro, as luvas, e se achegou à porta, andando devagar por sobre a grama do jardim. Eu fiquei na calçada, segurando as bicicletas e o coração.
Logo que a porta soou algumas batidas, a mulher saiu da nossa vista. Alguns segundos depois, a porta se abriu e um homem forte apareceu e perguntou:
- Pois não?
- Boa noite, senhor. Desculpe se incomodamos. A gente sabe que hoje não é um dia muito conveniente para surpresas desse tipo, mas nós acabamos ficando sem muita escolha... Saímos de Clermont à cinco dias com a intenção de chegar hoje na casa de alguns dos nossos mais caros amigos, em Tramelan, na Suíça. Seria justamente para passar o Natal com eles. Mas o caminho se revelou mais árduo do que esperávamos, e hoje, no fim do quinto dia, estamos na metade do caminho.
À medida que falávamos, completando-se as frases um do outro, o homem, de braços cruzados e olhar severo escutava. De repente, ele tomou a palavra, abrindo um sorriso muito simpático, dizendo:
- Um canto para armar a barraca? Claro! Acho que um banho também cairia muito bem, não? Depois de dias de pedalada...
O espírito experimentou a trégua mais doce, um alívio inesquecível, estávamos no olho do furacão. E ele continuou:
- Podem se instalar por aqui, perto da casa. É o fim da rua, não tem movimento de carros; vocês vão poder ficar tranqüilos aqui. Daqui a pouco eu volto, vocês vão poder tomar seu banho, e a gente conversa mais - e entrou.
Cecília me abraçou e chorou.
Depois de armado o acampamento, ela foi a primeira a entrar no banheiro. Eu fiquei conversando com nosso anfitrião sobre o percurso, sobre tudo que já tínhamos passado. Ele era engraçado, bem humorado, e em pouco tempo me deixou a vontade, embora meu estado não combinasse em nada com o ambiente aconchegante de sua casa. Sua esposa saiu para a missa com os dois rapazes de pouco menos de dez anos. Eles disseram que gostavam de andar de bicicleta também.
Ele ficou, não foi à missa, mas garantiu que não era por nossa causa; ele estava de plantão e poderia ser chamado ao trabalho a qualquer momento. Companhia de gaz e eletricidade. Enquanto Cecília tomava seu banho, ele me explicou que sua esposa estava desconfiada e com medo, que se ele não tivesse o número de alguns colegas da polícia no telefone celular, além de um porte atlético, não teria ousado abrir a porta.
Cecília saiu do banho e veio juntar seu sorriso ao nosso. A meu turno, fui tomar meu merecido banho quente. Quando saí, não vi Cecília.
- Ela encontrou meu computador – disse sorrindo nosso novo amigo.
Subimos as escadas de madeira, e num canto escritório, entre portas de quartos, ela escrevia concentrada diante da face familiar do gmail.
- Já escrevi para a família. Agora estou escrevendo para Marcel e para Thierry – disse enquanto chegávamos.
Conversamos mais um pouco, desejamos-lhe feliz Natal e fomos para nossa barraca. Foi a última vez que o vimos. Não sabemos o nome dele, mas eu sei seu rosto, seu sorriso e seu propósito. Deus tinha colocado um anjo no nosso caminho.
Assim foi o primeiro Natal no nosso casamento. Éramos apenas nós dois, mas não estávamos sozinhos.
Depois de comer, enrolei os colchonetes isolantes e os sacos-de-dormir enquanto Cecília equipava as bicicletas. A cada noite, nós retirávamos todos as partes elétricas, que não suportariam a umidade da noite. As garrafas d'água vinham também, logicamente, por outra razão: nós precisávamos da água. Então, enquanto eu arrumava uma parte da bagagem, Cecília cuidava disso. Cadeado, lâmpadas traseiras, dianteiras, velocímetro, garrafinhas.
Depois, eu comecei a refletir sobre como carregar os sacos de dormir. Nada do que tínhamos pensado até então tinha funcionado perfeitamente. Primeiro, Cecília carregava o dela, eu o meu. Só que o peso nas costas dela doíam em mim, embora ela não reclamasse. Já no segundo dia, eu amarrei os dois colchonetes na mochila dela (350 g) e os dois sacos-de-dormir na minha (2,5 k). Me parecia justo. A barraca foi amarrada na N1, no quadro durante o primeiro dia, e atrás da cela do segundo ao quarto dia. Essa configuração deixava minha bagagem extremamente desconfortável. O peso é suportável, mas os sacos-de-dormir pendurados eram muito desajeitados a cada vez que eu tinha que retirar a mochila, e também enquanto pedalávamos. Na manhã do quinto dia, eu estava resoluto a começar o dia com uma solução melhor. Decidi tentar amarrar os dois sacos-de-dormir atrás da cela da N1 e a barraca na mochila. Assim, o maior peso estaria sobre a bicicleta, e haveria um elemento a menos pendurado às minhas costas. Foi nesse dia que nasceu a melhor configuração, se bem que ela não era ainda perfeita, como iríamos verificar.
Quando tudo estava empacotado e pendurado na gente, fomos saindo da floresta, empurrando as bicicletas também carregadas.
Uma vez na estrada, pedalamos muito e conversamos bastante também. Decidimos ficar atentos à hora do almoço, e avançar o máximo possível. Nesse dia, as paisagens se revelaram as mais lindas. As colinas de pasto tinham um verde especial, vimos uma igreja antiga e majestosa, que se passaria por castelo. Nos deparamos com uma manada de bois e vacas, guiada por um homem a pé, seguida por outro à trator. Quando eu estava passando, vi um carro que vinha no sentido oposto que certamente atrapalharia Cecília, que estava mais atrás. Passei a manada e parei mais à frente. Voltando-me para trás, vi que, de fato, ela precisava esperar uns momentos. Foi aí que eu percebi um velhinho passando ao meu lado, a meio quilômetro por hora.
- Bom dia! - Exclamei.
Ele abriu um sorriso e respondeu um bom dia não muito nítido, no momento em que Cecília passava. Segui atrás dela por algum tempo.
Enquanto pedalava, eu olhava para o eixo do pedal, escrutando quanto mais ele iria girar. Antes que o defeito se manifestasse novamente, paramos em um vilarejo tão calmo, que nos dissemos que era uma cidade fantasma. Não vimos ninguém, nem gente nem bicho. Nem uma janela aberta. Nada.
A vila era realmente pequena, com duas ou três ruas que se cruzam, e dois caminhos que dão na estrada departamental, um inclinado para cada direção, formando um pedaço de pasto triangular. Percorremos um pouco da vila, procurando algum sinal de presença, e vimos dois carros estacionados em frente a uma casa. Nos aproximamos e tocamos o sininho que pendia ao lado da porta. Quando uma senhora apareceu, pedimos água e, talvez uma ferramenta, para tentar consertar a bicicleta.
- Ah, eu vou chamar meu filho. Ele pratica bicicleta.
Momentos depois, um homem formado, alto e loiro, apareceu, perguntou qual era o problema, olhou o pedal, mexeu, e começou a balbuciar um diagnóstico técnico, entre soluções possíveis, enquanto mergulhou de volta no interior da casa, de modo que ouvimos sua voz se afastar, sem se calar. Não deu para entender muita coisa. Mas me parecia que ele sabia o que estava dizendo, e algo muito lógico me dizia que ele voltaria com uma caixa de ferramentas.
Minutos depois, eu me vi diante da N1 sem algumas peças do pedal, sendo martelada violentamente de um lado, enquanto eu apoiava um pedaço de madeira do outro. Enquanto martelava, o homem declarou que já correu muito de bicicleta, que já fez corridas importantes, de enduro, e que agora fazia outros esportes. Perguntou até onde iríamos, se o frio não atrapalhava muito, e não parava de trabalhar. Os golpes de marreta que N1 estava suportando me pareciam muito duros, mas o homem não tinha pedido licença, tinha tomado toda a liberdade de martelar o que quisesse, e parecia tão certo do que fazia, e afirmava experiência tão vasta no assunto, que eu não ousaria interrompê-lo. Além disso, o que mais eu poderia fazer?
Pouco tempo depois, nós agradecemos, ele nos desejou boa estrada, sua mãe ofereceu comida, nós recusamos polidamente, e seguimos viagem, com o pedal bastante diferente. O rolamento está podre, mas até o momento em que eu escrevo é o mesmo, e não travou mais.
Carregamos conosco também a preciosa informação de que encontraríamos uma loja especializada em bicicleta na cidade de Tournus, a 50 km dali. E decidimos que naquele dia chegaríamos naquela cidade. Pedalamos o dia inteiro, com a responsabilidade de termos que avançar o bastante para consertamos a bicicleta, que ainda não sabíamos se estava curada, e encontrarmos um cyber-café para mandarmos notícias para o Brasil e para a Suíça.
Foi com esforço que alcançamos nosso objetivo, mas já era um pouco tarde, o sol se pôs um pouco antes de chegarmos ao centro da cidade e encontrarmos aberta a tal loja. Queríamos comprar também um bagageiro para Rippley e dois pares de óculos escuros (tínhamos perdido os nossos no primeiro dia da viagem). Um homem simpático nos atendeu, conversamos um pouco, ele analisou rapidamente N1. Ele nos deu o diagnóstico, que coincidia com o do esportista da cidade fantasma, e acrescentou que a ferramenta necessária tinha quebrado no dia anterior.
- Quebrou ontem?! E não tem outra ferramenta ou outra maneira de consertar?
- Não... Sinto muito.
Saímos da loja um tanto desanimados, mas era preciso seguir. Estava ficando tarde, precisávamos encontrar logo um lugar para montar a barraca. Saímos da cidade, pegamos novamente a estrada, mas estava escuro. Eu estava com medo. Encontramos um vilarejo com algumas casas grandes e bonitas. Nada de fazendas ou grandes pastos, uma área nobre – “vai ser difícil...”.
Era véspera de Natal. As janelas emanavam a felicidade egoísta do mundo moderno. Pouca gente ousaria abrir a porta. Poucas portas tinham campainha. A última casa da rua tinha um jardim enorme e umas árvores ao longe, atrás. Uma porta de vidro revelava uma cozinha aconchegante no interior, onde uma mulher remexia os preparativos de uma refeição. Já estava escuro. Cecília tirou a mochila, o gorro, as luvas, e se achegou à porta, andando devagar por sobre a grama do jardim. Eu fiquei na calçada, segurando as bicicletas e o coração.
Logo que a porta soou algumas batidas, a mulher saiu da nossa vista. Alguns segundos depois, a porta se abriu e um homem forte apareceu e perguntou:
- Pois não?
- Boa noite, senhor. Desculpe se incomodamos. A gente sabe que hoje não é um dia muito conveniente para surpresas desse tipo, mas nós acabamos ficando sem muita escolha... Saímos de Clermont à cinco dias com a intenção de chegar hoje na casa de alguns dos nossos mais caros amigos, em Tramelan, na Suíça. Seria justamente para passar o Natal com eles. Mas o caminho se revelou mais árduo do que esperávamos, e hoje, no fim do quinto dia, estamos na metade do caminho.
À medida que falávamos, completando-se as frases um do outro, o homem, de braços cruzados e olhar severo escutava. De repente, ele tomou a palavra, abrindo um sorriso muito simpático, dizendo:
- Um canto para armar a barraca? Claro! Acho que um banho também cairia muito bem, não? Depois de dias de pedalada...
O espírito experimentou a trégua mais doce, um alívio inesquecível, estávamos no olho do furacão. E ele continuou:
- Podem se instalar por aqui, perto da casa. É o fim da rua, não tem movimento de carros; vocês vão poder ficar tranqüilos aqui. Daqui a pouco eu volto, vocês vão poder tomar seu banho, e a gente conversa mais - e entrou.
Cecília me abraçou e chorou.
Depois de armado o acampamento, ela foi a primeira a entrar no banheiro. Eu fiquei conversando com nosso anfitrião sobre o percurso, sobre tudo que já tínhamos passado. Ele era engraçado, bem humorado, e em pouco tempo me deixou a vontade, embora meu estado não combinasse em nada com o ambiente aconchegante de sua casa. Sua esposa saiu para a missa com os dois rapazes de pouco menos de dez anos. Eles disseram que gostavam de andar de bicicleta também.
Ele ficou, não foi à missa, mas garantiu que não era por nossa causa; ele estava de plantão e poderia ser chamado ao trabalho a qualquer momento. Companhia de gaz e eletricidade. Enquanto Cecília tomava seu banho, ele me explicou que sua esposa estava desconfiada e com medo, que se ele não tivesse o número de alguns colegas da polícia no telefone celular, além de um porte atlético, não teria ousado abrir a porta.
Cecília saiu do banho e veio juntar seu sorriso ao nosso. A meu turno, fui tomar meu merecido banho quente. Quando saí, não vi Cecília.
- Ela encontrou meu computador – disse sorrindo nosso novo amigo.
Subimos as escadas de madeira, e num canto escritório, entre portas de quartos, ela escrevia concentrada diante da face familiar do gmail.
- Já escrevi para a família. Agora estou escrevendo para Marcel e para Thierry – disse enquanto chegávamos.
Conversamos mais um pouco, desejamos-lhe feliz Natal e fomos para nossa barraca. Foi a última vez que o vimos. Não sabemos o nome dele, mas eu sei seu rosto, seu sorriso e seu propósito. Deus tinha colocado um anjo no nosso caminho.
Assim foi o primeiro Natal no nosso casamento. Éramos apenas nós dois, mas não estávamos sozinhos.
Comentários
beijos, cheios de saudade.
Diferente de Naninha achei muito natural que uma família os tivesse acolhido, era a resposta pra minhas orações constantes e sempre regadas com muitas lágrimas.
Amo vcs demais, beijos com muitas saudades.
Mainha.
leia aí em cima.
Beijos.